Publicado por Marianna de Castro
Foi engolida pela opinião alheia, quando a afeição advinda da aceitação era tudo o que conhecia. Há não muito tempo, a Boa Menina se calava aos murmúrios de pontos de vista distintos. Era possível que o seu silêncio excessivo não fosse completamente sua culpa, afinal, no primórdio, é evidente que concordar com os outros pode trazer paz, no entanto, não é explícito que tal culpa vá embora.
Não discordar parecia eficaz para evitar gritos e discussões, mas fazia com que ela vivesse para os outros. Ela não encontrava razão nas desgastantes discussões que se estendiam na sala de aula e nos ambientes familiares e se desrespeitava ao contornar situações suscetíveis a debates.
Cultivando, fácil assim, o medo da própria voz. No primeiro círculo de argumentação da escola, não conseguiu participar. Isso não a surpreendeu nem um pouco, pois sabia que nunca havia feito aquele exercício antes. Era inexperiente demais para defender seu posicionamento em público. Chegara ao ponto de duvidar de suas próprias crenças, desconfiando não poder chamá-las assim, já que, na primeira oportunidade de abandoná-las para agradar alguém, ela era ligeira.
Embora possuísse dificuldade de compreender, observar pessoas desprovidas da angústia gerada pela desaprovação de seus pensamentos era belo. Metade de si permanecia, sem dúvida, contestando aquilo, contudo, a outra metade se enchia de um desejo desconhecido: conseguir se impor, ao menos, em algumas situações. Não usaria da argumentação sempre, disse a si mesma, somente com estranhos e, definitivamente, nunca com aqueles que a amavam, dado que, a Boa Menina acreditava ser merecedora desse amor por não contrariá-los.
Cresceu, tornou-se adulta e logo se viu na obrigação de presenciar situações as quais exigiam uma opinião pessoal sobre tópicos que jamais pensou considerar. Quanta ousadia do mundo, que sempre a elogiava pela falta de convicção, passar a requerer posicionamentos firmes tão frequentemente. A Boa Menina sentia-se perdida, porquanto, diversas vezes, a escolha certa parecia inexistente, havendo apenas posições criadoras de tumultos e discordâncias. Descobriu, então, possivelmente pela pior maneira, que discussões eram inevitáveis. Quando decidia não discutir um tópico importante, gerava complicações que poderiam vir a se manifestar com muita mais intensidade, criando uma discussão mais grave que a que havia sido evitada.
A troca do pacífico pelo caótico sempre lhe pareceu algo desnecessário e desgastante ao considerar a possibilidade de permanecer quieta. Entretanto, ao se dar conta da enorme quantidade de si que havia perdido devido a essa teoria, compreendeu que impor seus limites era, no mínimo, essencial. Estava começando a mudar seus hábitos que eram, até então, bem espontâneos, o que lhe custou bastante tempo e exigiu enorme coragem.
A Boa Menina passou, assim, a expressar sua opinião sempre que julgava relevante e, para isso, precisou lidar com aqueles que tentavam tornar cada oposição uma grande briga. Essas pessoas eram o motivo que a fazia pensar em continuar agindo como antes, porém, quando o estresse causado por elas passava, a Boa Menina permanecia acreditando no benefício de sua mudança. Para ela, era como se finalmente estivesse conhecendo a si mesma, sem a grande interferência do mundo exterior.
Permaneceu tentando se conhecer cada vez mais e, por mais doloroso que fosse, afastou-se o máximo possível dos egoístas e radicais que a faziam mal, pois ela percebeu que quem a ama verdadeiramente não a rejeitaria simplesmente porque começou a pensar por si mesma. A comunicação, recurso que não usava há tanto tempo para se impor, tornou-se essencial em sua vida. Ela ainda ouvia todos a sua volta, contudo, filtrava as sugestões recebidas e não se calava diante de algo só porque poderia levar a uma discussão.
O nome dela era Boa Menina pois o maior desejo de seus pais era que ela fosse genuinamente bondosa, embora muitos a sua volta passaram a chamá-la por adjetivos como “atrevida” e “exibida”. No entanto, ela já não se importava mais com esse tipo de ataque em um mundo onde ou se possui opinião própria ou se é possuído pela “opinião” alheia.
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