Resenha por Maria Fernanda Santos Feitosa em 8 de Setembro de 2022
Publicado por Beatriz Pinheiro Martins
Alguns dizem que o conhecimento é algo que molda sua ética e, para citar Sócrates, “existe apenas um bem: o conhecimento; e um mal: a ignorância”. Por isso, durante anos e anos, desenvolvemos uma tecnologia que pudesse facilitar o acesso rápido a qualquer tipo de informação, o que foi revolucionário para o mundo todo. Além disso, esse fenômeno aprimorou currículos e possibilitou a criação de novos empregos. Todavia, o mundo digital contém diversos conteúdos enganosos e informações falsas e, portanto, as fontes mais confiáveis, mesmo no mundo moderno, são os livros. Com a criação da internet, eles foram extremamente desvalorizados, fato que dificultou a diferenciação entre verossimilhança e conhecimento no mundo contemporâneo.
Na nossa sociedade, os indivíduos que escolhem ignorar a leitura não buscam conhecimento como antigamente. Mas e se os livros fossem proibidos na sociedade? Este é o cenário da distopia “Fahrenheit 451”, redigido por Ray Bradbury em um período histórico intenso: a Guerra Fria. Nessa obra, os bombeiros têm um trabalho adverso: atear fogo nos livros. É um tanto quanto chocante e contrastante com a realidade, porém, no livro, possuir e ler livros era considerado um crime. Todos os livros encontrados e conhecimento registrado em papel era queimado, ou seja, em outras palavras, censurado. Assim, vê-se que isso se assemelha à ditadura militar no Brasil.
Ao longo do exemplar, podemos observar que praticamente todo o corpo social distópico não tem interesse na leitura, pois sempre havia sido ensinado a ver livros como ameaças. Desse modo, um livro seria algo terrível para o indivíduo, como diz um trecho da obra: “Lembre-se, os bombeiros raramente são necessários. O próprio público deixou de ler por decisão própria.” A verdade é que o governo, na distopia, não queria que as informações corressem livremente, visto que poderiam criar diversas opiniões distintas e, possivelmente, contrárias ao poder. Além disso, esse efeito poderia resultar em questionamentos e até mesmo revoltas, assim como o filósofo Francis Bacon afirma: “O conhecimento é, em si mesmo, um poder”.
O personagem principal desta obra é Guy Montag, um bombeiro que sempre obedeceu os seus superiores e seguiu as ordens sem questionamentos. Tudo corria bem em sua rotina, até que ele conhece sua nova vizinha, Clarisse, uma adolescente que logo o intriga com suas grandes opiniões e pensamentos perigosos. Ela é capaz de fazer Montag trair os seus próprios ideais e logo ele começa a guardar livros em sua casa. Guy é completamente consumido pela leitura, mergulhando em um mar de conhecimento, algo que nunca havia experimentado antes. As coisas vão água abaixo quando Clarisse desaparece e Montag sabe muito bem o que aconteceria com ela. Afinal de contas, isso era parte de seu trabalho e foi esse pensamento que lhe trouxe raiva, visto que ele não conseguia impedir as autoridades de levá-la. Neste momento, ao seu ver, o governo estava completamente errado ao destruir tamanha cultura, queimando livros.
Seu comportamento mudou e sua esposa logo percebeu. Ela o confrontou sobre a situação, mas Guy não disse nada. Entretanto, ele foi descuidado e sua mulher encontrou seus exemplares, secretos e ilegais. Montag foi delatado por sua parceira e, por isso, teve que fugir. Ao longo de seu caminho e de sua nova vida, o próprio encontrou outros fugitivos que possuíam sabedoria incriminatória. Todos eles o lembraram de Clarisse e, portanto, ele se sentiu em casa.
Ray Bradbury não terminou o livro com um final conclusivo, apenas escreveu “Para quando chegarmos à cidade”, deixando o desfecho aberto à interpretação do leitor. Porém, o que não está a interpretação é a mensagem “chave” da história. A censura imposta pelo governo da distopia é impactante e negativa para uma boa parcela da sociedade e as pessoas não possuíam opiniões próprias, vivendo em uma bolha prestes a estourar a qualquer momento. O conhecimento e a sabedoria moldam o ser humano e, sem eles, a comunidade não tem rumo, ou seja, apenas segue ordens – que podem ser autoritárias – sem as questionar.
A obra é um grande espelho do mundo atual, mesmo sendo escrita em 1953, e muda a perspectiva de muitos leitores ao redor do globo, jovens ou maduros. Ray Bradbury, que vivenciou muitos marcos históricos ao longo de sua vida, trouxe muita riqueza a este livro e, por isso, fez um excelente trabalho escrevendo este clássico, que ainda prospera em meio à literatura atual.
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