As confusas e complexas primárias americanas

As confusas e complexas primárias americanas

Política Por Ana Clara, em 29/03/2020

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Candidatos democratas para as primárias 2020 (Lorenzo Bevilaqua/ABC)

Palavras estranhas vêm atormentando os jornais ultimamente quando se fala de eleições americanas: “democratas”, “primárias”, “delegados”, “caucus”, “convenção”, dentre outras. O sistema eleitoral americano é algo muito mais complexo que uma simples votação em que o candidato com o maior número de votos ganha. O processo começa bem antes de a eleição do presidente de fato ocorrer. 

Para início de conversa, é importante dizer que nos EUA há um sistema bipartidário, ou seja, há apenas dois partidos relevantes concorrendo, um mais à esquerda (Democrata) e outro mais à direita (Republicano). Há candidaturas de partidos menores, mas é raro que um representante que não seja de um dos dois partidos tenha a mínima importância no processo eleitoral (e, quando eu digo raro, quero dizer raro mesmo).

Neste ano, o atual presidente, Donald Trump, republicano, concorrerá à reeleição. Há mais de um ano, os democratas estão se preparando para decidir quem será o candidato que irá disputar contra Trump: esse processo é o que chamamos de primárias. Ao contrário do Brasil, para decidir quem vai ser o candidato do partido, há uma eleição, em que os cidadãos civis filiados ao partido podem votar.

O que deixa tudo mais confuso é que as primárias, assim como a eleição presidencial americana, não são diretas, mas sim indiretas. O candidato com mais votos em determinado estado não necessariamente é quem irá ganhar, pois eles não estão disputando o número de votos, estão concorrendo por delegados. Mas o que são esses malditos delegados? Delegados são os representantes do partido que são escolhidos para de fato votar em quem será o candidato. Podem ser tanto “delegados prometidos”, com base na votação do candidato apoiado por eles, quanto os superdelegados. Esse último grupo é composto por pessoas importantes no partido, eles têm liberdade de escolher quem quiserem.

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Caucus em Iowa 2008 (Dave Weaver/AP)

Mas como são escolhidos os “delegados prometidos”? Cada estado tem sua forma de votar, alguns escolhem pelo método de caucus e outros pelo de primárias propriamente dito. No caucus, há grandes ginásios onde as pessoas vão “votar”. Digo “votar”, pois não é exatamente um papelzinho onde a pessoa marca sua escolha e coloca na urna, nesse grande ginásio, cada candidato tem seu próprio canto. Os eleitores ficam horas nesse ginásio discutindo e resolvendo para que canto eles vão. Em um dado momento, há uma contagem das cabeças ou das mãos levantadas. Não, você não entendeu errado, é exatamente assim que funciona (no YouTube dá para ver vários vídeos mostrando como elas são, eu fortemente recomendo que você assista). Esse tipo de votação é bom para quem tem eleitores bem ferrenhos e que tem adoração pelo candidato, pois não é todo mundo que tem a boa vontade de comparecer a esses eventos. Já as primárias convencionais são votações convencionais com o uso de cédulas e urnas.

Porém, como eu disse um pouco acima, não é quem tem a maior quantidade de votos que necessariamente ganha. Parte dos delegados está reservada para o desempenho geral nos estados e outra para desempenho em cada distrito. Se um candidato tiver menos de 15% dos votos, ele é considerado “inviável” e não tem direito de levar delegado. Isso vale tanto para os votos reservados para o estado quanto para os distritais. Os votos alocados a cada unidade federativa são proporcionais à população absoluta e à quantidade de democratas no local. Por exemplo, a Califórnia tem um peso maior na convenção do que o Alabama, já que a população e o número de democratas são bem maiores. 

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David Proeber/ The Pantagraph via AP

As primárias não ocorrem todas no mesmo dia em todo território americano. Tradicionalmente, primeiro elas são realizadas em Iowa e, em seguida, em New Hampshire, o que dá a esses estados um peso desproporcional no rumo da eleição. Essa ordem é bastante criticada, em função dessas áreas serem pouco representativas, já que mais de 90% dos habitantes desses estados são brancos em comparação aos 60% de brancos no partido democrata. Os pleitos não são realizados simultaneamente para que os candidatos mais conhecidos ou mais ricos não sejam tão favorecidos, dando visibilidade também aos outros. Considera-se a data mais crucial a chamada “superterça”, quando são disputadas 15 primárias, inclusive a da Califórnia, com o maior colégio eleitoral. 

Em julho esse processo se culmina com a chamada “Convenção” (este ano ela será sediada em Milwaukee, Wisconsin) que ocorrerá entre os dias 13 e 16. Nela, os membros do partido fazem uma série de discursos delineando a agenda partidária para os próximos anos. Também é onde será a votação oficial pelos delegados para definir o representante do partido nas eleições gerais. Para que haja um vencedor, é necessário que este obtenha 1990 dos 3979 votos. Sim, é um sistema muito complicado e essa é só a ponta do iceberg.

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