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Entrevista com o dono da empresa que ajudou a construir nossa capital

Entrevista com o dono da empresa que ajudou a construir nossa capital

Entrevistas Por Mariana Amorim, em 09/05/2020

“A criação de Brasília, a interiorização do governo, foi um ato democrático e irretratável de ocupação efetiva do nosso vazio territorial”.

— Juscelino Kubitschek

A Engenharia é uma área cada vez mais requisitada no Brasil por conta de seus salários altos, porém, no Brasil, há falta de profissionais qualificados, mesmo havendo mais de 20 tipos definidos de engenharia.

“No dia 21 de abril de 1960, no governo do presidente Juscelino Kubitschek, foi inaugurada Brasília. Com o Plano Urbano de Lúcio Costa (o Plano Piloto) e, tendo como chefe da divisão de arquitetura, Oscar Niemeyer”

O que o levou a criar a Via Engenharia?

A primeira fase que eu tive na vida foi ser empregado. Eu tive a oportunidade de trabalhar no Rio de Janeiro, depois em Belo Horizonte e depois em Brasília, até um determinado ponto em que eu tive a oportunidade de fundar minha própria empresa, há 38 anos atrás, e até hoje ela continua procurando gerar empregos e atender à comunidade.

Quais são os desafios de ser empresário?

Eu vou tentar responder você de uma maneira muito interessante. Eu vou comparar ser empregado a ser empresário. O que significa ser empregado? Ele tem uma hora para começar a trabalhar e para sair do trabalho. Ele prestou seu trabalho, prestou sua contribuição e, no dia certo, ele tem o seu salário na conta. Um empresário tem a responsabilidade de pagar todos esses empregados, de pagar os fornecedores de material, de cumprir os contratos que ele assinou, ou seja, a diferença é: enquanto um empregado tem risco zero, porque no dia X chega o dinheiro na conta dele, o empresário não. Ele precisa ser eficiente para poder cumprir com os compromissos dele e sobrar alguma coisa pra ele.

O que o senhor pensa sobre crescimento rápido de empresas?

Eu acho que a gente tem que tomar muito cuidado com esse problema de crescimento de empresa. O crescimento de uma empresa tem de ser lento e gradual.  Quando a empresa dá um passo à frente, quando ela vai crescer, ela tem de ter certeza que está com o pé firme. A Via, durante esses 38 anos, teve um crescimento responsável, um crescimento dentro daquilo que a gente pode controlar.

Quais são seus sonhos para o futuro da Via Engenharia?

Meu sonhos para o futuro da minha empresa são bastante definidos. Eu já tenho uma idade avançada, então o primeiro sonho é que aqueles que venham me suceder, no caso, meus filhos, continuem a empresa, tenham condições de dar continuidade ao trabalho que eu comecei. E o segundo, que é muito importante, é que a empresa continue nas diretrizes que ela teve até hoje: de gerar empregos, gerar obras importantes no país, cumprir a sua missão social, cumprir a missão dela com o meio-ambiente, enfim, a empresa continuar como está independente da minha pessoa. Eu tenho certeza de que ela será melhor, porque cada um de vocês será melhor do que seus pais, pois o mundo vai evoluindo, as gerações vão tendo mais recursos, então, vocês hoje têm uma condição de serem muito melhores do que seus pais.

Qual é sua história em relação a Brasília?

Eu vim para Brasília em 1971, eu trabalhava em Belo Horizonte. Eu tive a oportunidade de, com um grupo de uma empresa na qual eu trabalhava na época, vir para Brasília para ver alguns trabalhos que essa empresa tinha. Quando eu cheguei aqui e vi aquela maravilha do Plano Piloto, eu pensei “é aqui o lugar onde eu vou me fixar”. Eu vim aqui para ver a construção do Ministério da Justiça (essa empresa fazia a instalação elétrica e hidráulica de lá), pra ver como era o andamento da obra e dar uma opinião, mas eu saí daqui convicto de que Brasília era o meu lugar. Aí eu estava em Belo Horizonte, desempenhando as funções pelas quais eu tinha sido contratado, e chegou um determinado dia em que surgiu uma oportunidade: uns amigos chegaram e disseram “nós estamos querendo abrir um negócio em Brasília, você topa?” E eu disse “é hoje”. Eu vim para Brasília, criei família e consegui, em 1980, fundar a Via com mais 2 outros amigos. E assim começou a minha vida profissional na cidade.

Qual é a importância da construção de Brasília?

A construção de Brasília talvez tenha sido o fato mais importante do século, porque havia uma exaustão em termos de ocupação física e em termos de saturamento em todos os aspectos do Rio de Janeiro. Essa região do Centro-Oeste era quase que selva, uma região quase inabitada, então, além de resolver o problema de estruturar uma capital, a construção de Brasília abriu um horizonte para uma nova fronteira na agricultura, na pecuária e até para algumas indústrias. Então, na minha opinião, foi o fato mais importante do século, porque, se Brasília não tivesse sido construída naquela época, não seria nunca mais e eu não sei como estaria a ocupação dessa região hoje em dia e como o Rio de Janeiro estaria mais congestionado ainda.

Qual é a sua história com a Via?

Eu comecei como um simples engenheiro de obras. Eu tive a oportunidade de ser chefe em alguma área de planejamento e controle na empresa que eu trabalhava em Belo Horizonte. Quando eu vim pra Brasília, criaram um cargo de diretor aqui pra mim, depois eu virei presidente da empresa. Então, chegou um certo ponto no qual eu havia ganhado um pouco de dinheiro. Guardei dinheiro e senti que chegou o momento em que eu devia dar meu passo próprio, ou seja, a minha missão que era ser um empregado na empresa, mesmo sendo presidente, tinha encerrado, então eu tinha que começar meu próprio negócio. Me juntei com dois amigos em 1980 e começamos, construindo um prediozinho no Núcleo Bandeirante, construímos outro prédio ali e outro prédio aqui, depois conseguimos fazer um prédio de seis pavimentos. Fomos crescendo e a empresa chegou nos dias de hoje com 38 anos.

Quais são os principais centros residenciais que a Via construiu em Brasília?

A Via construiu, nas minhas contas aproximadas, mais ou menos 60.000 unidades residenciais. Eu acho que aqui em Brasília, o melhor apartamento que eu construí é na 312, o Cap Ferrat. Ele é considerado um apartamento de alto luxo aqui em Brasília, é um dos locais mais procurados para as pessoas morarem. Também construímos, no setor Noroeste, coisas muito interessantes: há um prédio no setor Noroeste chamado Via Monumental, muito bom também, apartamentos muito bem projetados, acabamentos muito bons. Nós chegamos a construir 4.000 Unidades de casas populares de mais ou menos 40 m² lá na ceilândia em seis meses, então, nesse setor Residencial, a Via fez muitos bons trabalhos.

Quais são as principais obras da Via em Brasília?

Eu considero que a história nunca vai esquecer da Via. No Plano Piloto, a marca da via vai ficar por séculos e séculos. A Via construiu a Ponte JK. Essa ponte é considerada uma das pontes mais bonitas do mundo, uma entidade americana, que eu não me recordo no momento, premiou a Via pela Ponte JK como a ponte mais bonita do mundo. Essa é uma obra que foi construída em aproximadamente três anos. Todas as outras construtoras disseram que não fariam essa obra nesse prazo, então eu acho que a obra que mais orgulha a Via é a ponte. Outra obra de extrema importância é o Museu da República, é um projeto de oscar Niemeyer que fica do lado da Catedral. É um belíssimo projeto. É uma semi esfera com grande diâmetro, é uma obra muito bonita e ela forma um conjunto cultural, juntamente com a Biblioteca Nacional, muito importante. Existe uma obra que a Via construiu, que fica um pouco mais escondida, que é o prédio do TSE: outro projeto magnífico do Oscar Niemeyer, que foi o arquiteto que fez, junto com Lúcio Costa, o projeto da capital. Ele gostava muito desse tipo de semicírculos que têm no Senado, na Câmara e lá no TSE tem dois daquele tipo. Nós construímos, também, a Câmara Legislativa daqui de Brasília. Essa foi uma obra que faltou muito dinheiro, a Câmara teve muita dificuldade para ser construída, ela levou quase 10 anos, é um projeto de um arquiteto de Belo Horizonte que ganhou um concurso para apresentar esse projeto. E finalmente uma obra marcante que, certamente, no desenrolar dos anos, vai consolidar sua importância: o Estádio Nacional de Brasília, que é um dos estádios mais bonitos do mundo. Ele tem características muito próprias, tem um projeto muito avançado. É um projeto que não tem similar no mundo. É um projeto que teve muita polêmica em Brasília, porque ele era pra ser feito de uma maneira e ele foi construído para 70.000 pessoas, o que é considerado muito grande, mas tudo deu certo e é uma obra muito bonita. Essas são as principais obras da Via aqui em Brasília.

Qual é a história da Ponte JK?

A Ponte JK tem uma história interessante: ainda no governo do governador Cristóvão Buarque, foi feito um concurso nacional. O governo do DF publicou na imprensa que pretendia construir uma ponte, essa ponte teria aproximadamente 1200 metros, seria no lago Paranoá e o GDF estaria aberto a receber propostas, cada arquiteto com sua criatividade, o seu pensamento e, no desenrolar desse projeto, as pessoas apresentavam suas ideias e houve um julgamento que analisava as várias opções. Essa ponte é belíssima e inédita, não há pontes semelhantes no mundo. Nesse projeto da ponte de Brasília, aqueles cabos de aço dão sustentação à ponte, o que transforma a Ponte em uma ponte estaiada, com aqueles suportes em arco (ela é única no mundo com esse sistema). Então esse arquiteto teve uma visão muito interessante para a ponte: dependendo do local que nós estamos em relação à ponte, a forma dela muda. Se nós analisarmos outra ponte de Brasília, de qualquer ângulo você a vê do mesmo jeito, a JK não, ela muda, aquele sistema de arcos faz com que ela fique diferente a cada ângulo. E, vencida essa parte de projeto, houve outro concurso para saber quem construiria a Ponte e a Via ganhou. A Ponte já começou com uma dificuldade, já que não havia um local certo pra fazer a ponte e ela não se encaixava no local pré definido, então, o comprimento da ponte teve que ser aumentado entre 40 e 60 metros; depois, pessoas com visão mais esclarecida, alertaram o governador da época que o tráfego na ponte seria muito grande, então o número de pistas foi aumentado de 4 para 6 faixas. Muitos ridicularizam e disseram que seria instável, dizendo que era muito megalomaníaco, mas não é verdade. Se não tivéssemos aumentado as pistas, a ponte teria um congestionamento imenso nos horários de pico. A Ponte foi construída nesse prazo de 3 anos com muita dificuldade, a formação da ponte foi muito diferente do previsto: ela precisou de uma fundação toda especial, muito difícil, execução muito cara e assim foi a luta para construir a Ponte, uma ponte que é cartão postal, referência internacional.

Qual foi a obra mais difícil da Via em Brasília?

A obra mais difícil foi o estádio. Eu nunca vi, nos meus 55 anos de formado, uma obra que tinha 40 guindastes de 100 toneladas. Foi uma obra de engenharia muito séria, muito trabalhosa, de muita tecnologia, porque, além das dificuldades da construção, aqueles pilares do estádio são muito altos, o prazo de realização foi muito curto, e foram 288 pilares muito pesados, por isso necessitamos de tantos guindastes.

Qual foi a construção mais desafiadora?

Eu acho que foi a ponte Juscelino Kubitschek. Acho que foi uma obra muito difícil, porque ela tem uma fundação muito complicada, pois esse lago foi aterrado, o fundo dele é de material muito ruim, muito podre, e essa fundação teve dificuldades muito grandes para ser executada, como também, a própria ponte, com suas características arquitetônicas muito bonitas, nos deu muita dificuldade, então eu digo que esse foi o maior desafio que a gente já teve.

Houve algum projeto para Brasília que não saiu do papel?

Aqui em Brasília, lamentavelmente, por questões políticas, não saiu do papel uma obra que estava prevista para a Copa do Mundo: a construção do VLT, que saía do aeroporto, passava pela W3 e chegava lá na estação rodoviária. Nessa obra, a Via, em consórcio com uma empresa francesa fornecedora de vagões de metrô e de VLT, ganhou a concorrência; essa obra seria completamente financiada pelo governo francês, mas, com a mudança de governadores e o advento do PT, não permitiram que a obra fosse concluída e isso foi lamentável para Brasília, porque, hoje, as dificuldades para fazer essa obra serão muito maiores, não tem financiamento garantido.

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Mariana Amorim

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