O dinheiro estadunidense esqueceu da humanidade
Publicado por Laís Paixão

Neste final de semana, os Estados Unidos mandaram um questionário de 36 perguntas para a Organização das Nações Unidas (ONU), no qual constava, em uma das questões, se a instituição possuía alguma filiação com o comunismo. Obviamente, a organização se recusou a responder tais questionamentos, haja vista que o inquérito demonstra uma compreensão completamente equivocada dos seus princípios.
Entretanto, o formulário trouxe à tona um medo que vem alastrando-se no cenário atual: será que os Estados Unidos pretendem abandonar o trabalho humanitário ou, até mesmo, a própria Organização das Nações Unidas? A resposta a essa indagação pode mostrar-se contraditória, mas, com as recentes medidas do novo governo, é algo que requer a atenção internacional.
Durante toda sua campanha eleitoral, Donald Trump deixou claro sua intenção de fazer um corte considerável de gastos no país, que seria dirigido por Elon Musk. O argumentoapresentado pelo presidente consiste na suposta incoerência em conceder dinheiro estadunidense a inúmeros indivíduos que não são cidadãos americanos. Firme nessa crença, ao ser eleito, ele colocou o projeto em prática desde o primeiro dia de governo. A partir de então, sob a liderança de Russell Vought, o Escritório de Gestão e Orçamento dos Estados Unidos tem trabalhado incansavelmente em parceria com o CEO da Tesla.
Nesta segunda, dia 10 de março, verificou-se que 83% do financiamento da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional foi oficialmente cancelado. O USAID (United States Agency for International Development), cujos recursos são divididos entre proteção, crescimento econômico, agricultura, saúde infantil e materna, infraestrutura, educação básica, entre outros, consiste no principal meio dos Estados Unidos de auxiliar osoutros países e seus recursos.
O Pepfar, projeto para erradicar o HIV que não só ajuda diversas pessoas a conseguirem tratamento, mas é um dos meios de pesquisa dos EUA para achar uma cura para a doença, também vem lutando contra grandes cortes em seu orçamento. De acordo com estatísticas do Modelo Internacional de Eficiência em termo de Custos da Prevenção de Complicações com AIDS, o cancelamento total do financiamento provocaria a morte, pelo vírus, de 1.585.000 pessoas nos próximos dez anos, em comparação ao óbito de 601.000 com oprojeto sem nenhum corte.
Em janeiro, Trump também anunciou a saída dos EUA da Organização Mundial de Saúde, fazendo com que, no dia 10 de março, fosse assinado na OMS um documento com as medidas para lidar com o novo cenário, como a demissão de diversos funcionários. Nesse contexto, o diretor geral da organização realçou seus medos no cumprimento do projeto de erradicação da poliomielite e na assistência para a África durante a epidemia de “mpox”.
Apesar do supracitado aparentemente indicar que a grande potência norte-americana deixará de ser a principal representante da ajuda humanitária, o poder de Trump é, ao fim do dia, limitado, e essas medidas já estão sendo rebatidas por diversas pessoas ao redor do mundo. A título de exemplo, cita-se o juiz federal Amir H. Ali, o qual cuidou de uma ação judicial contra a administração do presidente e, como resultado, mandou o governo pagar quase 2 bilhões de dólares para seus parceiros em ajuda humanitária. Pode-se ressaltar também os protestos variados que estão acontecendo através do país, nos quais estadunidenses deixam claro que isso não é o que eles querem para o mundo.
É inevitável lembrar que os Estados Unidos têm um legado de ajuda humanitária, sendo opaís que mais investe nesse setor. São décadas de presidentes que favorece morganizações filantrópicas, e não à toa. Esse investimento sempre trouxe diversos benefícios para o país, como empregos, visibilidade, possibilidade de estudos e, principalmente, poder. Os EUA garantem uma grande parte da sua capacidade de influenciar o globo com a ajuda humanitária. E, como se observou anteriormente, quandoTrump, em seu primeiro governo, saiu da OMS, o próximo presidente (Joseph Biden), fez questão de voltar rapidamente para a organização.
Não obstante, isso não significa que a situação que estamos seja trivial ou algo para não olhar duas vezes. Ainda é a primeira vez que vemos os Estados Unidos com uma política tão radical de corte de custos, a qual pode causar mudanças significativas no cenário mundial dos próximos anos. É essencial, pois, destacar que a gestão de um país tem inúmeras camadas e necessita da aprovação de diversas pessoas. Ao analisar medidas tão bruscas como essas, são imprescindíveis calma e compostura, lembrando sempre que o mundo não é definido por somente um país.